Celular preso ao pé pode ajudar a detectar doenças neurológicas
01 de março de 2021
Atualizado: 09 de março de 2021
Assessoria de Comunicação
Smartphone poderá ser utilizado para identificar possíveis anomalias na caminhada humana. Foto: Francisco Ambrosio Garcia/Arquivo pessoal

Imagine um dia utilizar um aplicativo de celular capaz de monitorar e identificar possíveis anomalias na caminhada de uma pessoa, auxiliando profissionais da saúde no diagnóstico ou tratamento de alguma doença, como Parkinson e Alzheimer, enfermidades que podem afetar a capacidade de locomoção de um indivíduo. O primeiro passo para o desenvolvimento de uma tecnologia como essa foi dado em um estudo que está sendo conduzido na Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) da USP que pretende tornar esse tipo de avaliação mais simples, barata e precisa. 

A ideia dos pesquisadores é realizar a tarefa utilizando os chamados sensores inerciais, que são encontrados no interior de smartphones (são eles que permitem a tela girar conforme o aparelho é virado). Responsáveis por medir grandezas como aceleração e velocidade, esses sensores podem ser conectados a aplicativos e gerar dados que permitam avaliar se cada movimento da passada humana está sendo feito corretamente. “Além de identificar parâmetros alterados nos passos por conta de uma eventual patologia, esses sensores poderiam ser aplicados para monitorar a evolução do paciente durante um tratamento de recuperação motora a partir de métricas previamente definidas, auxiliando o médico a tomar suas decisões”, explica Francisco Ambrosio Garcia, autor da pesquisa, que faz parte de seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), e estudante do curso de Engenharia Elétrica da EESC. 

Atualmente, os sensores inerciais são utilizados de forma avulsa para esta finalidade, acompanhados de equipamentos específicos, que não estão disponíveis para a população em geral, do uso de câmeras, sensores de pressão e da infraestrutura de laboratórios especializados, tornando o processo mais caro e complexo. “O diferencial do meu trabalho foi que eu aproveitei os sensores que já estão embutidos em todos os aparelhos celulares modernos para fazer esse mapeamento. Isso pode permitir que, no futuro, o sistema de acompanhamento seja desenvolvido apenas como um aplicativo que o paciente instalaria no celular, eliminando a necessidade de adquirir novos dispositivos, que muitas vezes têm alto custo”, explica o jovem. 

Sensores inerciais avulsos tornam o processo de análise de caminhada mais caro e complexo. Francisco Ambrosio Garcia/Arquivo pessoal

Para testar a nova abordagem, Francisco teve a ideia de amarrar um smartphone em um de seus pés para que os movimentos da caminhada fossem obtidos. Os dados eram enviados para um aplicativo disponível em sistemas Android e automaticamente repassados para o laptop do estudante, onde ele pôde interpretar as informações: “A solução que eu encontrei, embora pareça precária, obteve resultados comparáveis a trabalhos já existentes que utilizam equipamentos disponíveis em laboratórios especializados. Os resultados foram bastante promissores e abrem caminho para trabalhos futuros”, afirma o aluno, que teve a ideia a partir das condições impostas pela pandemia do novo coronavírus, que demandou o isolamento social e comprometeu a presença de estudantes nos laboratórios da USP. Nos próximos passos da pesquisa, Francisco pretende investigar se é possível realizar o mesmo tipo de monitoramento com o celular dentro do bolso. 

Outra vantagem de utilizar apenas o celular para obter os dados dos pacientes é que o acompanhamento remoto do usuário seria facilitado, permitindo que as informações sejam coletadas de forma contínua e enviadas a um profissional da saúde. “Os atuais sistemas de reabilitação e acompanhamento a distância de pacientes ainda não são tecnologias maduras e, embora existam alguns sistemas pontuais de telereabilitação no Brasil, na grande maioria dos casos o paciente precisa se deslocar até um laboratório ou clínica especializada para fazer a coleta dos dados”, explica.

Formação e experiência- O estudante teve o primeiro contato com a ciência logo no primeiro ano de graduação, quando realizou iniciação científica (IC), com bolsa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). Ele foi orientado por Marco Henrique Terra, professor do Departamento de Engenharia Elétrica e de Computação (SEL) da EESC e coordenador do INCT-SAC. “A IC permitiu que eu aprendesse métodos científicos e me proporcionou o contato com pesquisadores de diversas nacionalidades, o que, culturalmente, enriqueceu muito minha vivência na graduação”, conta. 

Francisco deseja trabalhar com problemas desafiadores para ajudar pessoas. Foto: Francisco Ambrosio Garcia/Arquivo pessoal

Por meio de uma parceria da USP com instituições francesas, o aluno teve a oportunidade de fazer um intercâmbio na escola Supélec, uma das mais prestigiadas do país na área de Engenharia Elétrica, da qual ele também receberá um diploma. Durante a experiência, ele revela que uma das diferenças que notou entre a graduação nos dois países é que no Brasil o foco das disciplinas é voltado para a resolução de problemas práticos, o que ele considera ser mais “mão na massa”. Já na França, a parte teórica está mais presente, com alto rigor matemático. 

Ainda no país europeu, o aluno realizou estágio em uma das maiores empresas de transporte público do país. De volta ao Brasil, fez um novo estágio junto à indústria, em São José dos Campos. Agora, por fim, está trabalhando com métodos computacionais em biomedicina. Todas essas experiências serviram para mostrar o amplo campo de atuação que alguém formado em engenharia elétrica possui. “Uma lição que aprendi ao longo dessas experiências é a importância de sermos flexíveis. No mercado de trabalho nos deparamos todos os dias com problemas diferentes daqueles vistos em sala de aula, por isso precisamos nos adaptar rapidamente a diversos contextos e novas tecnologias. Descobri que, independentemente da área que eu venha a atuar no futuro, me interesso por problemas desafiadores, que de alguma forma possam ajudar pessoas”, finaliza.

Por Henrique Fontes, da Assessoria de Comunicação do InSAC


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