Quanto valem os benefícios de uma floresta? Livro da USP debate pagamento por serviços ambientais
24 de fevereiro de 2025
Atualizado: 06 de março de 2025
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Foto: Victor Ranieri / EESC USP

Você sabia que a chuva não é apenas um fenômeno climático que atrapalha passeios? Ela, na verdade, presta um serviço essencial para todos nós, ajudando a regular a temperatura, irrigar o solo e abastecer aquíferos. E não só ela: florestas, riachos e até praias estão constantemente trabalhando a nosso favor, oferecendo benefícios conhecidos como serviços ecossistêmicos. 

Mas e se fosse preciso pagar por esses serviços para garantir sua manutenção? Esse é o ponto do debate sobre o chamado Pagamento por Serviços Ambientais (PSA), que é discutido no livro Introdução ao instrumento econômico pagamento por serviços ambientais: boas práticas e integração com instrumentos de planejamento, lançado gratuitamente no Portal de Livros Abertos da USP​ neste link.

Rhennan Mecca Bontempi, Bartira Rodrigues Guerra e Victor Eduardo Lima Ranieri, pesquisadores da EESC e autores do livro - Foto: Reprodução

Organizada pelos especialistas Rhennan Bontempi e Bartira Guerra, ambos da Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) da USP, com orientação do professor Victor Ranieri, a obra apresenta conceitos fundamentais do PSA, além de discutir boas práticas e sua integração com políticas públicas. O livro nasceu a partir das pesquisas de mestrado dos autores, com a intenção de se tornar material de referência para estudantes, gestores ambientais e tomadores de decisão. “Nosso objetivo é divulgar esse conhecimento e fazer com que ele saia do centro de pesquisa, dialogando com outros centros, institutos, universidades e, claro, com a sociedade”, afirma Bartira Guerra​.

Em linhas gerais, a ideia do PSA pode ser sumarizada como: quem protege ou recupera áreas ambientais recebe uma compensação financeira por isso. No entanto, o livro deixa claro que o conceito não é uma solução para tudo. “A maior pretensão deste livro não é trazer novidades, mas sim apresentar conceitos básicos e auxiliar graduandos e pessoas que estão estudando ou se especializando”, afirma Rhennan​ Bontempi. Segundo ele e o professor Victor Ranieri, o material pode ser útil tanto para quem está começando no tema quanto para gestores que precisam entender melhor o funcionamento do PSA.

 


Comparação entre uma mesma área com práticas agrícolas nocivas ou com boas práticas agrícolas, resultante do acordo de PSA firmado entre as partes (produtores e comunidade beneficiada) - Foto: Reprodução/Pagamentos por serviços ambientais

Comparação entre uma mesma área com práticas agrícolas nocivas ou com boas práticas agrícolas, resultante do acordo de PSA firmado entre as partes (produtores e comunidade beneficiada) - Foto: Reprodução/Pagamentos por serviços ambientais

Comparação entre uma mesma área com práticas agrícolas nocivas ou com boas práticas agrícolas, resultante do acordo de PSA firmado entre as partes (produtores e comunidade beneficiada) - Foto: Reprodução

Desafios do modelo de pagamento

Apesar de trazer um panorama abrangente sobre a aplicação do PSA, o trabalho não se limita a elogiar o modelo. Pelo contrário, os autores fazem uma análise crítica dos desafios e limitações dessa abordagem. “O PSA não é uma solução milagrosa que vai resolver todos os problemas. Precisamos compreender em que situação esse instrumento se encaixa”, pontua Ranieri. Para ele, não faz sentido pagar por áreas que já são protegidas naturalmente ou que não sofrem pressão econômica para desmatamento, por exemplo.

Outro ponto levantado pelos pesquisadores é o custo e a burocracia envolvida no monitoramento dos serviços ambientais. “O que se monitora são as ações dos proprietários para cumprir o contrato do PSA, como o plantio de mudas, e não o serviço ecossistêmico em si, pois o custo de monitorar diretamente esse serviço é muito alto”, explica o docente. Esse detalhe pode gerar distorções no sistema, tornando o PSA menos eficaz do que o esperado.

Além disso, há o risco de “vazamento”, termo usado para descrever situações em que a proteção de uma área leva ao desmatamento de outra, deslocando o impacto ambiental sem necessariamente reduzi-lo. “O monitoramento foi uma das boas práticas mais citadas na literatura internacional, mas ainda existem muitos desafios que precisam ser superados”, reforça Bartira Guerra​.

Página da publicação que está disponível para download gratuito - Foto: Reprodução

“Quem vai pagar a conta?”

Para o professor Victor Ranieri, o e-book tem um papel importante na conscientização da sociedade sobre a necessidade de discutir o futuro ambiental do País. “Quem vai pagar a conta pelas ações necessárias para que a humanidade tenha esperança de um futuro em um planeta habitável? É fundamental que esse conhecimento seja aberto para trazer clareza a essa discussão”, conclui.

E Bontempi reafirma que a obra não tem como objetivo promover o PSA como estratégia definitiva. “Nosso objetivo não é apenas criticar ou defender, mas apontar pontos fortes, fracos, problematizar e fomentar um debate sério sobre o PSA, seus limites e sua aplicação na realidade brasileira”, argumenta. Ele cita, por exemplo, que o agronegócio tem forte influência sobre as políticas ambientais no País, e que a implementação do PSA precisa levar em conta as populações vulneráveis e as desigualdades socioeconômicas do Brasil.

Livro aborda como exemplo o caso do PSA no município de Montes Claros, em Minas Gerais, com o programa de Ecocrédito e a proposta de compensação às ações de recomposição florestal - Foto: Josue Marinho/Wikimedia Commons

Sobre a escolha de disponibilizar o livro gratuitamente no Portal de Livros Abertos da USP, o trio de organizadores confirma que a ideia faz parte de um esforço para democratizar o acesso à informação. “É importante que essas informações, esse conteúdo, tudo o que foi desenvolvido – os pensamentos, os conceitos – tenham uma base acessível para quem está começando e quer entrar nesse tema. E tudo isso está interligado com a democratização do conhecimento”, finaliza Guerra.

O e-book Introdução ao instrumento econômico pagamento por serviços ambientais: boas práticas e integração com instrumentos de planejamento pode ser baixado gratuitamente neste link.

Por Denis Pacheco, do Jornal da USP


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